segunda-feira, 6 de julho de 2009

Um pouco de história da música ou curiosidades...

Músicos e Demônios ou músicos demônios?
Com o surgimento do violino e, bem depois,do piano, os limites do possível foram expandidos além da imaginação. O arco do violino reinventado por François Tourte no séc. XVIII fez a pirotecnia subir de vez aos palcos, as partituras transbordarem exigências e os compositores alucinarem. A música no passado curava picadas de aranhas (Tarantella) e seduzia as mulheres. De exorcisar demônios, passou a andar de braços dados com eles. Tartini, no séc. XVIII, sonhou que o próprio capeta havia lhe tocado uma peça maravilhosa,quase impossível. Sentou-se e passou a escrever o que ouvira: “O Trillo (ornamento musical) do Diabo”.Nicolò Paganini chegou à exaustão, e criou uma peça difi cílima sobre apenas uma corda (as demais, na prisão, haviam se partido), ou, como piada,entre a primeira e a quarta cordas, o que fazia com um truque. Seu corpo fi cou anos exposto, coberto por um vidro. As mãos, enormes, e a síndrome de Marfan, doença que permite aos contorcionistas de circo dobrarem as juntas nas duas direções, lhe foram generosas. Já o romântico Goethe, amigo de Beethoven, inspirou Thomas Mann em seu monumental Doktor Faustus, que descreve o pacto celebrado entre um jovem músico, Leverkhün, e o cão, o diabo: “Destruído pelo extraordinário, seu humor arruinado por nada, ele vai fi nalmente deteriorar se no desespero de executar o impossível. O problema para ele era, para seu crescente tédio e seu contagiante desgosto, o porquê de ele ainda estar dentro dos limites do possível”. “Os pianistas maravilhosos e suas máquinas voadoras” trouxeram novos holofotes à execução. Liszt, virtuoso húngaro conhecido como “O Paganini do Piano” compôs coisas malucas como os “Estudos Transcendentais” (o título é apropriado). Improvisava tanto que, em um concerto, o maestro aguardando o fim da cadência (o trecho em que o solista demonstra sozinho sua virtuosidade), ao acenar com a cabeça pedindo o retorno do tutti (a orquestra inteira), ouviu do maestro: “mas de qual música?”. Liszt pode ter sido o inventor da tietagem: pagava um troco para meninas aos prantos durante as apresentações,com direito a desmaios, moda que voltou um século depois com Beatles e Elvis. O grande castrato Farinelli (os castrati tinham suas genitálias esmagadas com duas pedras exatamente para manterem a voz feminina, devido à baixa testosterona) foi outro exemplo de encapetado. A Caruso se reputava poder quebrar um cálice de cristal com a voz. O lendário Yehudi Menuhin nunca teve aula de técnica, indo direto à música, e aos doze já tocava todos os Caprichos (tem nome melhor?) para violino de Paganini. Um trompetista maluco, Maynard Ferguson, fez um enxerto nos lábios com músculos de seus glúteos (isso mesmo, nádegas, ainda não se fazia enxerto de silicone) para alcançar as notas mais agudas, como fosse um violino. Meu professor, o solista Edwin Barker, aos 23 já havia conquistado postos em 3 das principais orquestras americanas: Chicago, Nova Iorque e Boston. Sobre ele, foi escrito um livro especial: Staying Power (algo como O Poder de Permanecer, que também soa como Stay in Power – Ficar no Poder). Seu professor, Portnoi, dizia que ele tinha coisa com o demo. Termino com uma recomendação aos jovens candidatos a virtuosi: evitem a aproximação com entes nada confi áveis. Mas o diabo (olha ele de novo) é que é tentador entrever os limites do possível, é da natureza humana. A técnica traz perfeição, mas perfeita em música é a beleza, não a virtuosidade atlética dos “possuídos”.
Henrique Autran Dourado(atual diretor do Conservátorio de Tatuí)

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