quarta-feira, 1 de julho de 2009

CARTA ENCÍCLICA:FIDES ET RATIO

Um pequeno trecho da carta maravilhosa do Papa JOÃO PAULO II AOS BISPOS DA IGREJA CATÓLICA SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE FÉ E RAZÃO.
CAPÍTULO VIINTERACÇÃO DA TEOLOGIA COM A FILOSOFIA 1. A ciência da fé e as exigências da razão filosófica 64. A palavra de Deus destina-se a todo o homem, de qualquer época e lugar da terra; e o homem, por natureza, é filósofo. Por sua vez, a teologia, enquanto elaboração reflexiva e científica da compreensão da palavra divina à luz da fé, não pode deixar de recorrer às filosofias que vão surgindo ao longo da história, tanto para algumas das suas formas de proceder como para realizar funções mais específicas. Sem pretender indicar aos teólogos metodologias particulares — porque tal não compete ao Magistério —, desejo, porém, lembrar algumas funções próprias da teologia, onde, por causa da própria natureza da Palavra revelada, se exige o recurso ao pensamento filosófico.65. A teologia está organizada, enquanto ciência da fé, à luz dum duplo princípio metodológico: auditus fidei e intellectus fidei. Com o primeiro, recolhe os conteúdos da Revelação tal como se foram explicitando progressivamente na Sagrada Tradição, na Sagrada Escritura e no Magistério vivo da Igreja. (88) Pelo segundo, a teologia quer responder às exigências próprias do pensamento, através da reflexão especulativa.Quanto à preparação para um correcto auditus fidei, a filosofia proporciona à teologia a sua ajuda peculiar, quando examina a estrutura do conhecimento e da comunicação pessoal, e sobretudo as várias formas e funções da linguagem. Igualmente importante é a contribuição da filosofia para uma compreensão mais coerente da Tradição eclesial, das intervenções do Magistério e das sentenças dos grandes mestres da teologia: estes, de facto, exprimem-se frequentemente por conceitos e formas de pensamento conotados com determinada tradição filosófica. Neste caso, pede-se ao teólogo não só que exponha conceitos e termos através dos quais a Igreja possa reflectir e elaborar a sua doutrina, mas que conheça profundamente também os sistemas filosóficos que tenham, porventura, influenciado as noções e a terminologia, a fim de se chegar a interpretações correctas e coerentes.66. Relativamente ao intellectus fidei, importa considerar, antes de mais, que a Verdade divina, « que nos é proposta nas Sagradas Escrituras, interpretadas correctamente pela doutrina da Igreja », (89) goza de uma inteligibilidade própria, logicamente tão coerente que se deve propor como um autêntico saber. O intellectus fidei explicita esta verdade, não só quando investiga as estruturas lógicas e conceptuais das proposições em que se articula a doutrina da Igreja, mas também e sobretudo quando põe em realce o significado salvífico de tais proposições para o indivíduo e para a humanidade. É pelo conjunto destas proposições que o crente chega a conhecer a história da salvação, que culmina na pessoa de Jesus Cristo e no seu mistério pascal; ele participa deste mistério, com a sua adesão de fé.A teologia dogmática deve ser capaz de articular o sentido universal do mistério de Deus, Uno e Trino, e da economia da salvação, quer de modo narrativo, quer sobretudo de forma argumentativa. Por outras palavras, deve fazê-lo mediante expressões conceptuais, formuladas de modo crítico e universalmente acessível. De facto, sem o contributo da filosofia não seria possível ilustrar certos conteúdos teológicos como, por exemplo, a linguagem sobre Deus, as relações pessoais no seio da Santíssima Trindade, a acção criadora de Deus no mundo, a relação entre Deus e o homem, a identidade de Cristo que é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. E o mesmo se diga de diversos temas da teologia moral, onde é preciso recorrer, de imediato, a conceitos como lei moral, consciência, liberdade, responsabilidade pessoal, culpa, etc., cuja definição provém da ética filosófica.Por isso, é necessário que a razão do crente tenha um conhecimento natural, verdadeiro e coerente das coisas criadas, do mundo e do homem, que são também objecto da revelação divina; mais ainda, ela deve ser capaz de articular este conhecimento de maneira conceptual e argumentativa. Assim, a teologia dogmática especulativa pressupõe e implica uma filosofia do homem, do mundo e, mais radicalmente, do próprio ser, fundada sobre a verdade objectiva.67. A teologia fundamental, pelo seu próprio carácter de disciplina que tem por função dar razão da fé (cf. 1 Ped 3, 15), deverá procurar justificar e explicitar a relação entre a fé e a reflexão filosófica. Já o Concílio Vaticano I, reafirmando o ensinamento paulino (cf. Rom 1, 19-20), chamara a atenção para o facto de existirem verdades que se podem conhecer de modo natural e, consequentemente, filosófico. O seu conhecimento constitui um pressuposto necessário para acolher a revelação de Deus. Quando a teologia fundamental estuda a Revelação e a sua credibilidade com o relativo acto de fé, deverá mostrar como emergem, à luz do conhecimento pela fé, algumas verdades que a razão, autonomamente, já encontra ao longo do seu caminho de pesquisa. A essas verdades, a Revelação confere-lhes plenitude de sentido, orientando-as para a riqueza do mistério revelado, onde encontram o seu fim último. Basta pensar, por exemplo, ao conhecimento natural de Deus, à possibilidade de distinguir a revelação divina de outros fenómenos, ou ao conhecimento da sua credibilidade, à capacidade que tem a linguagem humana de falar, de modo significativo e verdadeiro, mesmo do que ultrapassa a experiência humana. Por todas estas verdades, a mente é levada a reconhecer a existência duma via realmente propedêutica à fé, que pode desembocar no acolhimento da Revelação, sem faltar minimamente aos seus próprios princípios e autonomia. (90)Da mesma forma, a teologia fundamental deverá manifestar a compatibilidade intrínseca entre a fé e a sua exigência essencial de se explicitar através de uma razão capaz de dar com plena liberdade o seu consentimento. Assim, a fé saberá « mostrar plenamente o caminho a uma razão em busca sincera da verdade. Deste modo a fé, dom de Deus, apesar de não se basear na razão, decerto não pode existir sem ela; ao mesmo tempo, surge a necessidade de que a razão se fortifique na fé, para descobrir os horizontes aos quais, sozinha, não poderia chegar ». (91)68. A teologia moral tem, possivelmente, uma necessidade ainda maior do contributo filosófico. Na Nova Aliança, a vida humana está efectivamente muito menos regulada por prescrições do que na Antiga. A vida no Espírito conduz os crentes a uma liberdade e responsabilidade que ultrapassam a própria Lei. No entanto, o Evangelho e os escritos apostólicos não deixam de propor ora princípios gerais de conduta cristã, ora ensinamentos e preceitos específicos; para aplicá-los às circunstâncias concretas da vida individual e social, o cristão tem necessidade de valer-se plenamente da sua consciência e da força do seu raciocínio. Por outras palavras, a teologia moral deve recorrer a uma visão filosófica correcta tanto da natureza humana e da sociedade, como dos princípios gerais duma decisão ética. Vale a pena ler a carta inteira http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_15101998_fides-et-ratio_po.html

2 comentários:

Rabiscos de Amor disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rabiscos de Amor disse...

Oi gatinha!

A sabedoria do Papa João Paulo II, nos exorta a uma nova reflexão e busca de um entendimento maior, principalmente na junção do meio filosófico com o teológico.
Apesar de particularmente saber dessa necessidade filosófica na igreja, nunca fiz uma leitura mais profunda!
Parabéns pela iniciativa!

Beijos

Mi